Benvindos!

A idéia de criar este espaço surgiu aos poucos. Nasceu da necessidade de expandir o grupo de pessoas com as quais me correspondo ou com as quais converso sobre temas de interesse em comum. Desejo que seja um lugar de troca de idéias e informações, mas , sobretudo, de boa conversa, democrática e sem preconceitos. Mais uma vez, benvindos.



segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Serviços no Brasil: caros e ruins.

Pois é, comprei mais um livro via Livraria da Folha. Da única e última vez que o fiz, enviaram-me uma capa de cd sem conteúdo. Mais de trinta dias para trocar. Tive que entrar em contato diversas vezes por telefone e e-mail com o  setor de relacionamento com os clientes (ou seja lá que nome tem) até que a troca fosse feita.

Fiquei com o pé atrás de tratar com  a empresa novamente. Aconteceu, porém que, meses depois, buscava eu um livro específico para minhas leituras noturnas. O produto estava disponível apenas na Livraria da Folha. Hesitei. "Comprar mais uma vez na Livraria da Folha ?" Eu queria muito o livro, ainda mais porque tratava-se de uma edição especial comemorativa.
No dia seguinte venci minha resistência pensando que talvez o problema anterior tivesse sido uma questão logística que poderia ocorrer a qualquer empresa. Comprei!

O livro chegou... com o box da caixa rasgado, amassado. Ok, o que importa mesmo são os livros, mas a empresa me cobrou caro pelo pacote comemorativo que incluía uma caixa lindamente decorada com desenhos relativos a história contada pelo livro. Era algo a mais que foi cobrado.
Pedi a troca do produto há dois dias. Nada de resposta até agora.

Agora vamos comparar com uma compra que meu irmão realizou no exterior.
Trouxe o produto para nosso país. Com alguns meses de uso, o bem apresentou defeito.
Meu irmão buscou a assistência técnica em sua cidade e mesmo em outras fora de seu estado de residência.
Recebeu em todas oportunidades, como resposta,  que não havia como consertar. Teria que comprar outro por aqui mesmo pagando muito mais caro do que pagou lá fora.
Insatisfeito com as respostas (bastante insatisfeito, na verdade), ele resolveu entrar em contato direto com o fabricante do produto (fabricante este que se localiza no exterior). A pessoa com a qual falou pediu para que ele explicasse o que ocorreu e enviasse a nota fiscal de compra por e-mail.
Feito isso, em poucos minutos retornou e pediu que meu irmão destruísse o produto que adquiriu, tirasse uma foto e enviasse novamente por e-mail.  Ele receberia um produto novo em poucos dias com os custos de remessa pagos pelo fabricante.
Meu irmão ficou indeciso (quem não ficaria, conhecendo o tipo de atendimento que temos por aqui ?)
Mas,... vá lá..., o produto estava com defeito mesmo. Quebrou-o e envio a foto. Poucos dias depois chegou o produto substituto.

Não se trata de comparar nosso país com outros (detesto estas malditas comparações de vira-latas), mas é fato que aqui no Brasil pagamos caro por bens e serviços, e ainda, não poucas vezes, recebemos péssimo atendimento.

Não importa se público ou privado, sempre suspiro e penso muito antes de adquirir/solicitar serviços ou bens. Na maioria das vezes você não recebe o que esperava, seja em termos de forma, de prazo ou de atendimento.
Quase sempre o bem/serviço está aquém daquilo que foi noticiado ou propagado.

Telefonia móvel, automóveis, serviços de seguros, e outros mais poderiam ser citados como recordistas de preços altos e péssimos serviços/atendimentos no caso do setor privado; enquanto saúde, educação e previdência social ficariam na faixa dos campeões de reclamações no setor público.

De onde vem tanto descaso ? Qual o motor destas relações desiguais ? Acredito que a causa vem, sobretudo, da relação historicamente autoritária do Estado frente a sociedade brasileira.  
O autoritarismo que está no cerne das relações estatais vis-à-vis cidadania criou um efeito pernicioso que abarca nossas interações sociais, políticas e econômicas. A relação da sociedade com o Estado em nosso país sempre foi ditada não pela cidadania, mas pela subordinação. O aparato administrativo tem "poder de império" em suas decisões*. Ora, impérios têm súditos, não cidadãos. Obedece-se, não se discute.

Não há um setor da máquina pública que nos retorne de maneira condizente o que pagamos. Os motivos para isso são muitos. Posso detalhá-los em outro momento. Por enquanto o que desejo frisar 
o fato de nós pagarmos enquanto contribuintes por algo, não garante que seremos bem atendidos em nossas necessidades de cidadãos.  Pelo contrário, os serviços públicos são vistos como uma prebenda, um favor doado por aqueles que se mantém no poder. 
Vais reclamar de um favor ? Vais reclamar de terem te arranjado um atendimento em um posto de saúde ou hospital sem precisar esperar semanas ou meses ?  Fique quieto e agradeça o poderoso que te colocou ali. Desejas matricular teu filho em uma escola próxima de casa e não consegues ?  Vá bater na porta do gabinete de um vereador, deputado ou do prefeito que eles te fazem esse favor. 
Como falar de cidadania neste contexto ? 

Se o serviço público é ruim, como no caso de saúde, educação e previdência (só para citar os mais importantes), à iniciativa privada basta oferecer algo um pouco melhor (um pouco menos ruim) e cobrar. Não há competição! Quem já não ouviu a frase; "Vais tirar teu filho do colégio para colocar em uma escola pública ? Tá louco ?" Ou ainda, quem não ouviu, quando o(a) menino(a) não quer nada com os estudo, na forma de  sentença ameaçadora ou de punição: "Vais para um colégio público"?
Ir para um hospital público é, no senso comum, coisa de gente sem recursos que vai passar por longo suplício de horas, dias ou semanas de espera. Então, mesmo pagando, me submeto a um atendimento de razoável a ruim no hospital particular para não ter que ir para o atendimento público. É a escolha entre o ruim/razoável e o péssimo. 



Assim, se espraiou na sociedade brasileira a percepção de que, se você me paga para receber um produto ou serviço, eu, Estado,  empresa ou pessoa física, vou lhe dar a contrapartida quando minhas  condições forem as melhores, e não me encha o saco! Prazos ? Não me aborreça com detalhes!




 Felizmente algo começou a mudar a este respeito. As pessoas estão mais combativas e lutam por seus direitos, mas há um longo caminho ainda para vencermos a inércia do poder estatal e das empresas.


*vide a redação dos textos de nosso Direito Administrativo e das análises dos especialistas sobre o tema. O Estado aparece como entidade divina, capaz de julgar e submeter a todos com base no pressuposto que age na busca do estrito bem-comum. A palavra cidadão é escassa nos documentos e análises da área. Em contrapartida, verbos como "submeter", "impor" e termos como "à discricionaridade da administração pública", são abundantes.