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A idéia de criar este espaço surgiu aos poucos. Nasceu da necessidade de expandir o grupo de pessoas com as quais me correspondo ou com as quais converso sobre temas de interesse em comum. Desejo que seja um lugar de troca de idéias e informações, mas , sobretudo, de boa conversa, democrática e sem preconceitos. Mais uma vez, benvindos.



segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Stoner de John Williams

Ontem terminei de ler Stoner, livro de autoria de John Williams. Sem dúvida, foi o melhor livro que li  este ano. 
Seu lançamento se deu em 1965. À época conseguiu um pequeno sucesso em vendas, mas logo foi esquecido.  Dada a qualidade do texto, tal olvidamento chega a ser inusitado. 




A história narrada em Stoner é prosaica.  Williams usa de linguagem simples, direta, sem poesia ou ornamentação para contá-la.  Stoner é um homem de origem humilde, que se gradua na universidade, começa a dar aulas, se casa, tem uma filha, desfruta de uma amor extra-conjugal e envelhece. Nada mais. A maneira, porém, como esta história simples é contada, nada tem de banal. Williams consegue nos prender à leitura de seu livro desde o início. Talvez a empatia que nos acomete em relação ao personagem principal desde logo, não permite que abandonemos facilmente a leitura. 
Por conta de abordar experiências bastante comuns pelas quais todos nós, de uma forma ou de outra, já passamos (relação com os pais, mudança de vida, amor, dedicação, casamento, vida profissional, paternidade e morte), a história de Stoner nos toca imediatamente. 
A narrativa nos é apresentada em terceira pessoa ao longo de todo texto.  

O livro começa com Stoner menino na pequena fazenda dos pais. A vida é dura e sem luxos para os três (Stoner é filho único). O pai de Stoner decide enviá-lo à universidade para estudar. ele deseja que o filho se forme em ciências agrárias, talvez com a esperança que o filho possa ter uma vida melhor e que ainda possa ajudá-los na fazenda futuramente.
As coisas não se sucedem como esperado. Stoner cedo descobre seu encanto pela literatura. Ele decide, então,  abandonar a idéia de se formar em ciências agrárias. 
Mais tarde, pouco antes de participar da cerimônia de sua graduação, Stoner conta a seus pais a verdade: ele não voltará à fazenda de  seus pais. Ele seguirá carreira acadêmica. Resignados, seus pais voltam para o campo.

O livro conta as várias tentativas de Stoner de buscar a completude da vida, seja no seu trabalho, seja na vida pessoal, e as diversas frustrações e sabotagens de que foi vítima, às vezes até de sim mesmo. Stoner não é um herói, é um homem comum. Ele tem seus momentos de alegria (não muitos),  de paixão pelo seu trabalho e por sua mulher (que logo se desfaz na percepção que o casamento foi um erro dada as diferenças de temperamento e valores de ambos). Contudo, ele também é uma pessoa extremamente passiva, raramente se rebela contra uma situação que lhe é imposta ou que lhe surge inesperadamente pela frente. Ele comete muitos erros de avaliação ao longo da vida. Em alguns momentos se acovarda, em outros é generoso, mas também se se encoleriza como ocorreu em sua relação profissional com um aluno seu. 

Porém, não é só ele que possui estas características de um personagem quase real em seus defeitos e virtudes. Quase todos os protagonistas de Williams possui componentes trágicos suficientes que os habilitariam a serem temas de outros romances.  Podemos citar aqui Edith, Lomax, Grace, Khaterine e, aquele que mais me intrigou, Charles Walker (aluno de Stoner).  

William construiu a narrativa com personagens tão complexos e humanos que nos é impossível simpatizar totalmente ou odiar na integralidade qualquer um deles. Eles se mostram frágeis, patéticos e indefesos em alguns momentos, e arrogantes, insensíveis e egoístas em outros. 

                                                                                     (John Williams)

Interessante é a solidão de todos os personagens durante todo o livro. Talvez com exceção dos pais de Stoner, que formam entre si um casal solidário e unido, os demais personagens são caracterizados por um estado permanente de afastamento social, incompatibilidades e isolamento. Mesmo nas reuniões de departamento e festas sociais, é possível sentir que eles se movem em  contextos em que não se sentem à vontade. Eles pouco falam, pouco dizem e sempre procuram uma fuga para sair de um conversa que se prolonga excessivamente. 
Talvez Williams tenha jogado bastante luz sobre a questão da hipocrisia social e das obrigações que nos são impostas por vivermos em sociedade. 

Por fim, creio que livro  por intermédio de uma história de vida banal, cheia de desapontamentos, fracassos e projetos abordados, nos faz a pensar sobre a brevidade e o significado das lutas e sacrifícios que fazemos ao longo da vida. O quanto apostamos em coisas que depois descobrimos sem importância, e o quanto abrimos mão de outras, que depois se revelam importantes ou fundamentais. 

É uma obra que vale a pena guardar para ler e reler.